segunda-feira, 2 de setembro de 2019

Quarenta e nove

Há exatos quatro anos eu reclamava das dores no corpo depois de quatro sessões de surf numa mesma semana. Agora, a queixa é que a dor é mais forte apesar dos seis meses sem conseguir ficar em pé na prancha.

No meu aniversário, em 2015, eu escrevi que havia chegado aos 45…do primeiro tempo. Achava, na época, que aos 49, estaria no último minuto dos acréscimos da primeira etapa. Enganei-me. O último disco da coluna lombar escancarou a fadiga desse corpo velho de guerra que há tanto tempo suporta as minhas extravagâncias. 

Dizem que as dores são avisos do organismo. Confesso, fazer-me de surdo é uma estratégia  de que abuso. Em tempos atuais, então, fiz da surdez seletiva um mantra.

Se eu tivesse dormido no meu aniversário de 2015 e só acordasse agora, pensaria ter voltado no tempo. Quando eu poderia imaginar quem em 2019 o discurso da guerra fria teria sido ressuscitado no Brasil? E com um monte de malucos levando a sério! Que artistas seriam censurados? Que a amazônia continuaria queimando, mas agora com chancela oficial? E que os mesmos malucos aplaudissem os piromaníacos com os carcomidos argumentos do progresso e da soberania nacional! E que eles, os malucos, tomassem como verdades absolutas tudo o que um tal de WhatsApp diz?

Ainda bem que agora tem a Catarina. Quatro anos atrás eu não tinha filho, lenço nem documento. E como é bom ver o progresso de um ser tão gente boa quanto ela. Não discrimina ninguém, brinca com todas as crianças que encontra, distribui beijos e sorrisos pra todo mundo.

É a Catarina que tem me feito sorrir nesta semana pós-cirurgia de coluna. Imagino a geração dela incrédula com a idiotice da minha. 

Vou comer um pedaço de bolo e brindar com uma cápsula de Tramal. Depois, vou tirar um cochilo considerando os 49 apenas um intervalo. O segundo tempo começa aos 50.

Por Romeu Piccoli