domingo, 5 de janeiro de 2014

2014 - O ano do improvável

No silêncio da mata, no meio da montanha, um pensamento. O ano novo vai ser patrono de uma reviravolta. Aliás, uma revolução. Não dessas que se fazem em junho, com cartazes, apitos, passeatas. Tampouco uma revolução armada. O que vai acontecer é uma organização silenciosa da desordem do mundo.

Tudo vai começar com Marco Feliciano. Ele vai sair. Sim. Vai sair do armário e, na sequência, da Comissão de Direitos Humanos da Câmara. E avisar aos primos com quem brincava de médico que podem romper a Lei do Silêncio. Eles vão contar, no Arquivo Confidencial, como eram as peripécias infantis do ilustre parlamentar, quando ainda não precisava interpretar o papel de radical homofóbico. O pastor vai deixar a Igreja e encabeçar a luta pelos direitos LGBT.

Não acredita?

Pois, sua surpresa será ainda maior quando um jato da FAB despencar em plena Praia de Boa Viagem.  A bordo? Renan Calheiros, devidamente capilarizado. A aeronave não só cairá, subitamente, deixando vivos o piloto e o co-piloto, que fugirão às pressas, como explodirá em seguida. E o primeiro combustível para as chamas, ironicamente, serão os dez mil fios recém implantados do senador. 

No sofá de casa, diante de Bonner e de sua colega de bancada, o brasileiro médio vai assistir a essas invulgaridades com estranheza e ansiedade. Tentando explicar às crianças que é tudo brincadeirinha, enredo de filme. 

O presidente do Supremo, Joaquim Barbosa, vai emburrecer. Subitamente, o repertório vocabular do meritíssimo evaporar-se-á. Ele vai se esquecer das chicanas e dos embargos infringentes. Não conseguirá dar ordens aos seus assessores. E será aposentado compulsoriamente quando não conseguir conter a baba na última sessão da corte.

Os mensaleiros não poderão comemorar. Por sua parte, também estarão babando. Só que em suas respectivas celas. Pizzolato, na Fontana di Trevi. Vai virar piada dos nigerianos que ficam à espreita.

Em outubro, ninguém vai entender de onde vieram as milhares de assinaturas registradas em cartório para a criação do Partido Solidariedade. Elas vão desaparecer nas urnas. E nem a "força" do além vai ser suficiente para eleger Paulinho. Convocado nas mesas brancas, Lech Walesa vai revelar que jamais se solidarizou com a fraude. Não com essa, pelo menos.

Vladimir Putin será flagrado dançando pelado num show particular da Banda Pussy Riots. E as fotos dele vão percorrer tantos quilômetros virtuais que até a Carla Perez vai entender a gravidade da coisa.

Carlos Drummond de Andrade vai levantar a bunda daquele banco público da orla carioca para dizer que não é o autor de centenas de frases mal elaboradas que lhe atribuem, arbitrariamente. Marx e Engels também vão ressuscitar para pedir a condenação imediata de Fidel Castro. E ele, finalmente, vai morrer de susto quando souber.

Mas a surpresa maior virá na Copa do Mundo. Joseph Blatter, Jérôme Valcke, Ricardo Teixeira e Peter Siemsen, presidente do Fluminense, estarão juntos na área VIP da Arena Corinthians, quando Edward Snowden aparecerá no telão, como um  Patrick-Swayze-fantasma. Ele dirá que todas as saídas estão trancadas e que o fim será irremediável apenas para este quarteto fantástico do futebol. Uma nuvem imantada de ácido sulfúrico se formará subitamente sobre a construção escandalosa. E uma chuva seletiva cairá sobre as quatro cabeças. Héverton, meia da portuguesa, estará em casa, assistindo à transmissão. Repórteres e apresentadores ficarão mudos. Mas o jogador vai entender tudo. E vai dar um meio sorriso, desses de canto de boca.

A confluência dos astros, apesar de toda desgraça, vai permitir a consagração de um campeão. E, claro, não será o Brasil de Neymar, nem a Argentina de Messi ou a Espanha de Iniesta e Casillas. A taça do mundo será do México. E a imagem de Frida Kahlo num auto-retrato debochado vai aparecer em cada uma das nuvens do mundo. Lembrando a todos a inevitabilidade da trajetória orbital.


A essa altura da conjuração, no silêncio da mata, no meio da montanha, pousa-me no braço um mosquito-careca-sugador-de-sangue-parecido-com-o-Renan. E me faz lembrar que dois mil e quatorze já começou. Mas o Marco Feliciano ainda é presidente da Comissão de Direitos Humanos.

Por Patrícia Ferraz

6 comentários:

  1. E é nesse ano que o mês do carnaval não vai ter a mínima importancia para as pessoas que finalmente entenderam que é uma festa festa popular que não leva a lugar algum... Genial esse texto Pati

    ResponderExcluir
  2. Até reconheço a importância cultural do carnaval, mas confesso que acho tudo um exagero! Valeu pelo comentário, Thamara! Obrigada mesmo! Beijão

    ResponderExcluir
  3. Do jeito que as coisas estão, não me espantaria em nada isso tudo acontecer.

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Verdade, Daniel… Tirando as agressividades figurativas do texto, muita coisa poderia mesmo acontecer pra remexer esse status quo! Valeu pelo comentário! Abraço

      Excluir
  4. Adorei o texto, minha Linda! Demais! Não consigo deixar de ser babona… Te amo! Beijos, Dali

    ResponderExcluir
  5. Falar com vc é sempre, sempre maravilhoso pro meu espírito. Amo vc. Muito. Beijos

    ResponderExcluir